Por Léa Lobo

Líder em sustentabilidade, descarbonização e justiça climática, Carlos Alberto Tavares Ferreira fala com exclusividade à InfraFM sobre o papel estratégico da água, o erro das empresas no ESG e o que os profissionais que atuam em FM precisam fazer já para acelerar a transição.
Ele transformou inquietação em legado. Criador da Carbono Zero, da Fundação Tavares Ferreira, do CAPES e dos Corredores de Água Boa, Carlos Alberto Tavares Ferreira é hoje uma voz quando o assunto é sustentabilidade com impacto real.
Aos 27 anos de atuação, dirige a Reserva Natural Nascentes do Rio Açungui — responsável por abastecer milhões de pessoas — e comanda programas de regeneração ambiental e justiça social que cruzam continentes. Na entrevista a seguir, ele joga luz sobre o papel das instalações prediais, da gestão da água e da verdadeira virada ESG no setor corporativo.
InfraFM - Como nasceu a ideia da Carbono Zero?
A Carbono Zero nasceu de uma inquietação: como transformar boas intenções ambientais em ações auditáveis? Em 2007, percebi que o mercado tinha muito discurso e pouca prática com rastreabilidade. Criamos nossos próprios protocolos, sempre com foco em soluções baseadas na natureza e impacto mensurável. O desafio foi romper com o greenwashing e construir confiança em um setor ainda especulativo.
InfraFM - Para o gestor de infraestrutura, o que significa a precificação de ativos verdes e azuis na prática?
Significa valorizar aquilo que sustenta a operação. Florestas, nascentes e áreas restauradas são ativos econômicos, não passivos. Quando um prédio adota telhados verdes, usa bem a água ou melhora a eficiência energética, isso pode gerar créditos certificados. Ou seja, além do benefício ambiental, há retorno financeiro, reputacional e regulatório. É um novo jeito de fazer conta.
InfraFM - E qual o papel da gestão hídrica nesse novo jeito de pensar?
Fundamental. Sem água, não há saúde, biodiversidade, nem energia. O programa Corredores de Água Boa, que lancei em 2004, parte dessa conexão vital. Investir na recuperação de nascentes, reflorestamento e controle de uso do solo torna cidades e empreendimentos mais resilientes às mudanças climáticas. Água é um ativo estratégico, não um insumo qualquer.
InfraFM - Como o CAPES aproxima ciência e realidade?
O CAPES é nosso centro técnico, um laboratório vivo. Juntamos academia, empresas e governo para criar modelos replicáveis: reflorestamento com espécies nativas, certificações, monitoramento de bacias hidrográficas. Já restauramos mais de 830 hectares com metodologia auditada. Nosso diferencial é unir ciência, escala e impacto socioambiental positivo.
InfraFM - Qual o erro mais comum das empresas ao tratar o ESG?
Tratar ESG como marketing ou como checklist. Sustentabilidade não é um departamento isolado, é uma cultura transversal. E cultura começa na liderança. Outro erro é não medir o impacto real. Sem indicadores auditáveis, tudo vira promessa. Meu conselho de ouro? Escute as comunidades, assuma falhas com transparência e tenha coragem de agir com consistência.
InfraFM - Por que impacto social é parte indissociável da sustentabilidade?
Porque não existe equilíbrio ambiental sem justiça social. Na Fundação Tavares Ferreira, envolvemos as comunidades em todas as fases: coleta de sementes, recuperação de áreas, turismo de base comunitária, produção agroecológica. Pertencimento gera cuidado. E quem cuida da floresta é quem se sente parte dela.
InfraFM - Que conselho você dá aos profissionais que atuam em Facility Management que querem acelerar a transição ESG?
Comecem pelo inventário. Não dá para gerir o que não se mede. Mapeiem consumo de água, energia, descarte, emissões. Depois, estabeleçam metas reais com parceiros sérios. Não precisa transformar tudo de uma vez — comece, e melhore continuamente. O FM que entende indicadores ambientais como eficiência econômica será cada vez mais estratégico.
InfraFM - E qual é o sonho que ainda move Carlos Alberto Tavares Ferreira?
Tornar os Corredores de Água Boa a maior iniciativa socioambiental integrada do Hemisfério Sul. Já estamos no Brasil e em oito países africanos. Agora, vamos expandir para o Sudeste Asiático e o Caribe. Quero um mundo onde as nascentes sejam protegidas como templos, onde empresas entendam que seu futuro depende dos ecossistemas e onde as comunidades liderem as soluções. Esse não é só um projeto. É um chamado — e estou atendendo com tudo o que tenho: técnica, alma e propósito.
A conversa com Carlos Alberto Tavares Ferreira deixa claro que sustentabilidade não é uma meta distante, tampouco uma obrigação protocolar. É uma escolha diária, estratégica e urgente — especialmente para quem gere infraestrutura, espaços e recursos dentro das organizações. A mensagem é direta: o futuro da gestão está na capacidade de gerar impacto ambiental mensurável, engajamento social legítimo e eficiência econômica com responsabilidade.
E, como bem disse o entrevistado, tudo começa com uma atitude simples, mas poderosa: medir, escutar e agir com coragem. Porque transformar o mundo — ou pelo menos os metros quadrados sob sua gestão — está ao alcance de quem encara o ESG com verdade, técnica e humanidade.