Houve um tempo em que sustentabilidade era classificado como assunto de “eco-chato” -aquele ser que insistia em proteger o meio ambiente. Com a evolução natural e necessária, sustentabilidade se tornou um valor real para as pessoas, para o mundo e com certeza, para as empresas. A bolsa de valores já considera o Índice de Sustentabilidade Empresarial como um valor real, nas cartas anuais de Larry Fink – CEO da BlackRock uma das maiores gestoras de fundos do mundo, a bandeira sustentável é o ponto central e diretivo das relações entre negócios e meio ambiente. A consciência da importância e finitude dos recursos ambientais não sendo mais restrito a poucos. A terra nomeada de “Casa Comum” por Leonardo Boff, pertence a todos nós, para nosso deleite e para nosso cuidado.
Atualmente quando nos referimos a sustentabilidade a visão, a consciência, o envolvimento, as ações e os impactos são mais amplos. Embora já exista há muitos anos, estamos vivendo o grande boom do ESG, esta tríade que tem definido a reputação das instituições.
Novas funções, novos cursos, novas áreas, novas oportunidades ao redor e em função do ESG. Novo argumento do marketing, embora, em muitos casos, ainda mais publicidade que realidade, reúne em seus pilares conceitos de extrema importância para a existência e convivência de tudo e todos: Environmental, Social and Governance que para nós: Ambiental, Social e Governança resulta na sigla ASG que nos remete ao nosso já tão conhecido Auxiliar de Serviços Gerais. Função tão necessária e ainda não tão valorizada, assim como outras funções operacionais, porém de grande impacto para o atingimento satisfatório e real dos índices de sustentabilidade. Assim, eu prefiro adotar ASG que me remete aos dois!
A instituição não faz nada, quem faz são as pessoas que lá estão. Uma pessoa mostra quem é a partir de suas atitudes sendo a soma das ações das pessoas atuam na empresa, que define quem é a instituição e qual é a sua reputação.
Em todos os níveis hierárquicos, em todas as funções! As pessoas são, determinantes nos 3 pilares ASG e não apenas no Social. É necessário o engajamento de todos e para isto é fundamental envolver, enxergar e reconhecer a todos. O que inclui também os terceirizados, prestadores de serviços, fornecedores e em alguns casos até os clientes.
A base operacional muitas vezes tão desconsiderada tem uma importância que necessita, urgente ser reconhecida. Muitas vezes é a atuação destes profissionais que define diretamente quem é esta organização - é uma cadeia de valor, da pessoa, da empresa que emprega e, no caso de terceirização, da empresa cliente.
Tenho visto muitas empresas com ações maravilhosas e legítimas, restritas aos seus funcionários. A estas informo que o S do ASG inclui os terceirizados, entre outros.
Eu tenho por hábito “visitar” banheiros que é uma ótima forma de conhecer uma instituição, são muitos detalhes que denotam inclusive a relação dos colaboradores com a instituição. Certa vez, após uma reunião em uma grande e importante instituição que atua e divulga os ODS (Objetivos do Desenvolvimento Sustentável) sendo uma referência do assunto, fui ao banheiro, seguindo meu hábito, que neste dia calhou de ser o banheiro do estacionamento. Foi uma das piores visões que eu já tive. Eu havia reparado apenas na placa “feminino” na porta e só depois percebi que era o espaço destinado às profissionais de limpeza. Importante dizer que nesta instituição os profissionais da limpeza devem estar sempre impecáveis na sua aparência. Relatando o que encontrei a uma pessoa da instituição, ela me respondeu muito surpresa que desconhecia esta condição e afirmando, que todos são muito bem tratados, sendo inclusive convidados para as comemorações “de aniversariantes do mês”! No que perguntei: Vocês também comemoram o aniversário deles? Recebi como resposta um tímido e sem graça sorriso.
A base do Social é o respeito que se inicia no reconhecimento do profissional enquanto ser humano. Somos todos diferentes, no corporativo, temos ainda diferentes níveis hierárquicos, funções deveres e direitos, no entanto, respeito e reconhecimento é direito de todos.
A indústria da limpeza emprega cerca de 800 milhões de profissionais em todo o mundo, um setor que movimenta milhões, que é ainda gerador de consumidores, diretos e indiretos e ainda paira a dúvida: São os profissionais da limpeza que não tem valor ou a limpeza ainda não é assumida como um valor? Ainda estamos sob os efeitos da pandemia, a limpeza ou ausência desta foi tão falada e consideramos reconhecida. O termo higienização se popularizou e de um dia para outro todos se tornaram especialistas, a popularização da limpeza, no entanto, não trouxe o reconhecimento e valor real a este profissional. Tanto se falou de capacitação, mas a velha questão “e se eu investir na capacitação e ele sair” ainda reina. Em uma profissão em que o piso e o teto salarial caminham juntos, qual o grande motivador para a mudança do local de trabalho se não o ambiente laboral? E assim voltamos a S do social e incluímos o G de governança referenciando a ética. Relação de trabalho também é baseada em ética. Uma entrega de trabalho adequada também é ética. Aos que ainda receiam por investir na capacitação, devolvo a resposta também já tão conhecida “e se ele ficar?”. Tanto se investe e valoriza a capacitação do profissional corporativo, e tanto ainda resiste a capacitação operacional.
Ainda, seguindo com o profissional da limpeza, é tão comum ainda escutar “Todo mundo nasce sabendo limpar”. Esta afirmação desmerece ao profissional da limpeza, aos fabricantes de produtos, equipamentos, e a todos nós usuários da limpeza. Quantos de nós sabemos destinar corretamente todos os resíduos que geramos? Capacitação é necessária para todos. Inegável a relação entre produtividade e um ambiente adequado de trabalho, o que com certeza, inclui a limpeza, a higienização. O setor da limpeza, como os demais, segue uma evolução crescente e gritante, por exemplo, economia de água e energia, quantidade de produtos biodegradáveis etc. Portanto com renovação constante e necessário de processos. E aqui temos um exemplo do A (ambiental). Quem executa? As pessoas, os profissionais da limpeza! Assim como qualquer profissional de qualquer nível hierárquico, de qualquer setor precisa estar preparado para executar corretamente. E esta preparação não se faz em uma conversa, ou em um curso rápido e pontual. A limpeza profissional é o resultado de processos, tecnologia e pessoas. Não é passar um pano, não é recolher lixo, juntar papeis e usar um produto cheiroso. Estamos na era do MOX (produto da empresa Maxitex) produzido com a reciclagem de uniformes.
É preciso conhecer e saber usar produtos e equipamentos, entender os pops, os processos, conhecer a instituição. É preciso ter a confiança e segurança para ser um profissional autônomo, ou seja, para fazer o correto independente de quem está olhando, ação, aliás, que é a base da ética, mas que por vezes precisa de apoio. Além de todo o conhecimento e autonomia gerado por uma capacitação ampla e de qualidade é preciso um ambiente com pessoas preparadas para relacionar com estes profissionais empoderados de seu conhecimento. O pessoal da limpeza representa não só a si, mas também a empresa que o contrata e os clientes, internos e externos, desta. A sua atuação técnica e comportamental, define não apenas a qualidade do ambiente usufruído, mas também repercute em sua reputação. Quem está sendo contratado para atuar na sua instituição? Se terceiriza, quais são os valores e atuação da empresa contratada? A cadeia da sustentabilidade não vai fechar, se os valores e práticas propostos não incluírem a todos. Quando algo dá errado não adianta a tentativa da instituição se proteger afirmando que o agente da ação é terceirizado. Ela contratou, ela é responsável!
É importante que a sustentabilidade, que os pilares ASG sejam uma responsabilidade de todos, e não apenas da “gerência de sustentabilidade”. As metas arrojadas, reais e necessárias, devem considerar seu atingimento, garantindo contratos adequados e condições de trabalho para todos, o que inclui também o uso de produtos e equipamentos que serão utilizados. Caso contrário, as ações de sustentabilidades continuarão sendo publicidade, que em algum momento se tornará negativa e nossa “casa comum” continuará correndo risco real! É preciso agir na verdade. Por exemplo quantas empresas tem publicado ações de diversidade, mas não atuam na base do racismo estrutural, sensibilizando e educando sua equipe. Cumpre ou tenta cumprir cota, mas não está preparada estrutura e culturalmente para receber a estes profissionais e voilà: capacitismo!
Quantas ações de equidade têm sido divulgadas, considerando lideranças femininas, mas ainda com salários menores? Não a meta não foi atingida. Não, não adianta convidar para os aniversariantes do mês. É preciso alinhamento real entre a fala e a ação. É preciso promover a educação não apenas para os conhecimentos técnicos, mas a que prepara a todos para a convivência e respeito, reconhecendo e valorizando cada um na sua função. Para isto é preciso enxergar, ouvir e reconhecer.
Assim todos conseguiremos entregar e usufruir da qualidade sendo agentes da sustentabilidade.
Que o ASG se faça com: Consciência, respeito e ética!
Cássia Almeida é Superintendente Executiva na Facop – Fundação de Asseio e Conservação do Estado do Paraná