Antes da pandemia de Covid-19, o Instituto McKinsey Global estimou que a Internet das Coisas, IoT (de Internet of Things, em inglês), teria um impacto potencial de US$ 3,9 trilhões a US$ 11,1 trilhões por ano até 2025. Na mesma linha, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, BNDES, estimou que até 2025 aplicativos e soluções de IoT movimentarão US$ 132 bilhões na economia brasileira. As projeções do Instituo McKinsey e do BNDES evidenciaram uma tendência que agora, diante da crise provocada involuntariamente pela pandemia, se coloca como uma saída premente no caso brasileiro: a busca por implementação de tecnologias e soluções que garantam máxima produtividade com menor custo. Nessa linha, as previsões indicam que uma implementação ampla dos conceitos da Indústria 4.0, sendo um deles a IoT, pode trazer uma redução anual da ordem de R$ 40 bilhões em custos com manutenção de equipamentos e complexos industriais e um ganho anual da ordem de R$ 30 bilhões em eficiência energética.
Para o setor de ar condicionado, ventilação e refrigeração, assim como em todos os demais, há muito caminho por percorrer. Equipamentos inteligentes e conectados, componentes com tecnologias inovadoras e novas concepções de projetos e sistemas fazem parte de uma vasta gama de soluções disponíveis para garantir a máxima eficiência das instalações. Além disso, os sistemas de ar condicionado figuram entre os maiores consumidores de energia elétrica dos edifícios comerciais e plantas industriais, sendo responsável por volta de 45% do consumo total - olhando para a divisão de consumo da matriz energética brasileira, os sistemas de ar condicionador podem consumir até 25% de toda energia elétrica produzida no país, o que torna qualquer redução bastante significativa.
Sistemas centrais de expansão indireta: soluções eficientes para os lados da água e do ar
Podemos analisar os sistemas centrais de expansão indireta, aqueles que dispõem de uma central de água gelada, por duas perspectivas. Do lado da água, o que se tem notado é um aprimoramento contínuo dos principais componentes, como compressores e ventiladores, que vem permitindo aos chillers convencionais alcançarem coeficientes de performance mais altos. Além disso, a tecnologia inverter aplicada nestes dois componentes, controlando suas velocidades de rotação conforme a demanda de carga, garante um ganho de até 40% em eficiência energética nas operações em cargas parciais. Há ainda os equipamentos dotados de compressores com mancais magnéticos, sem contato entre as partes móveis e livres de óleo lubrificante. Pouco difundida no Brasil, essa tecnologia pode aumentar em até 70% a performance energética dos chillers em comparação com o modelo convencional de compressor parafuso e velocidade de rotação fixa, dependendo da aplicação.
O lado do ar costuma ser deixado em segundo plano quando se discute a eficiência energética das instalações desse tipo, justamente pela parcela de consumo elétrico mais significativa representada pela central de água gelada. No entanto, em alguns casos, a parcela de consumo dos fancoils pode representar até metade do consumo total do sistema de ar condicionado, o que nos faz voltar a atenção também para esses equipamentos e para as tecnologias disponíveis para elevar sua eficiência energética. A principal delas é a utilização de ventiladores de acoplamento direto acionados por motores eletrônicos, que pode proporcionar uma redução de consumo elétrico da ordem de 30%, além de reduzir diretamente os custos com manutenção e reposição de peças. Os emissores de radiação ultravioleta, popularmente chamados emissores UVC, podem ser instalados diante das serpentinas para garantir sua integridade e evitar a obstrução da passagem do ar, reduzindo assim a perda de carga interna do equipamento e também o consumo do motor elétrico. A utilização de filtros de alta performance, fabricados dentro dos requisitos normativos, proporciona uma perda de carga inicial menor, também colaborando com a redução do consumo elétrico.
De maneira geral, é condição sine qua non para garantir a eficiência energética dos equipamentos, mesmo com a aplicação destes componentes e tecnologias citados, que eles sejam dotados de um sistema de automação e monitoramento embarcado e conectado à rede através de plataforma IoT - além de garantir os parâmetros especificados e a otimização da operação através dos sensores e controladores, o monitoramento via IoT permite acompanhamento em tempo real e tomadas de ações mesmo à distância.
A aplicação de cada uma dessas tecnologias contribui com uma parcela no desempenho dos equipamentos que, somadas, podem garantir até 45% de ganho em eficiência energética no lado do ar de um sistema de ar condicionado.
Unidade de tratamento de ar mod. TKZ com sistema de controle e automação embarcados, comunicação com sistema supervisório predial e monitoramento via plataforma IoT.
Sistemas dedicados para tratamento do ar exterior: qualidade do ar interno e eficiência energética
O sistema dedicado para tratamento do ar exterior (DOAS) possui uma capacidade única de garantir elevada qualidade do ar interno e aumento de eficiência energética simultaneamente, uma vez que trata de maneira independente as diferentes demandas de carga térmica do ar externo e do ar de retorno. Em uma instalação típica de edifício comercial o ar externo pode representar até 80% da carga latente, ou seja, carga associada à umidade, enquanto a carga térmica interna dos ambientes é composta basicamente por cargas sensíveis. Além de concentrar toda a carga latente demandada para o sistema em um único equipamento, o tratamento dedicado do ar externo também possibilita estabelecer um grau de filtragem mais elevado para todo o sistema de ar condicionado a partir de um único equipamento.
O sistema de tratamento dedicado de ar externo é ideal para aplicações com alta carga de calor latente e alta taxa de renovação do ar, nas quais as cargas internas são basicamente cargas sensíveis. O desacoplamento das cargas térmicas sensível e latente proporcionado pela utilização do sistema dedicado para ar externo faz com que a operação dos equipamentos seja otimizada, garantindo um maior controle da umidade do ar e extraindo a máxima capacidade das serpentinas, além de permitir o selecionamento de equipamentos menores para atendimento dos ambientes, o que reduz o consumo elétrico do sistema de forma geral. O equipamento dedicado para tratamento do ar externo também pode ser reduzido em termos de capacidade térmica com a instalação de um módulo recuperador de calor, que reaproveita parte da energia térmica do ar expurgado dos ambientes para pré-resfriar o ar externo e diminuir a demanda térmica - em algumas aplicações o recuperador de calor é responsável por todo o tratamento térmico do ar externo. A própria instalação do sistema de ar condicionado é otimizada e apresenta custo de execução menor, já que o sistema de suprimento de ar externo é centralizado e independente dos sistemas de ar condicionado dos ambientes.
O tratamento do ar externo em sistemas dedicados tem se mostrado uma solução extremamente eficiente, uma vez que abre diversas possibilidades para os demais sistemas que compõe a instalação. Além de proporcionar o desacoplamento das cargas térmicas sensível e latente dos ambientes, o que permite a utilização de diversas soluções eficientes para tratamento das cargas internas, como escalonamento da temperatura de água gelada e sistemas ar-água, ou até mesmo um sistema híbrido complementado por equipamentos de expansão direta, o sistema de tratamento dedicado para o ar externo proporciona redução significativa na capacidade total demandada para o sistema de ar condicionado, o que se traduz diretamente em menor consumo de energia elétrica e maior eficiência operacional.
Algumas simulações apontam que o sistema dedicado para tratamento de ar externo, quando combinado com um sistema ar-água nos ambientes e chillers operando com conceito de free-cooling, pode proporcionar um ganho de eficiência energética próximo de 80% em relação a um sistema convencional, dependendo das condições operacionais.
A vantagem principal do sistema dedicado para tratamento de ar externo é, portanto, o leque de possibilidades que ele abre para se garantir um aumento na eficiência energética de todo o sistema.
Central de água gelada: mesmos equipamentos, diferentes arranjos, máxima eficiência
Os diferentes arranjos de chillers e bombas na central de água gelada, bem como novas estratégias de fornecimento de água gelada em temperaturas escalonadas, têm se popularizado no Brasil pelos ganhos que proporcionam em eficiência energética.
Principalmente utilizado em projetos de grandes capacidades com dois ou mais chillers de condensação a água, as alternativas de arranjo em série e série com contrafluxo melhoram o desempenho dos chillers e proporcionam redução do consumo elétrico total do sistema. Os arranjos em série e em série com contrafluxo conduzem os fluxos de água gelada e de condensação em sentidos contrários, dividindo a carga térmica total entre os dois chillers - enquanto o fluxo de água gelada vai da saída do chiller A para a entrada do chiller B, o fluxo de água de condensação vai no sentido oposto, da saída do chiller B par a entrada do chiller A.
A diferença entre as temperaturas de saída da água nos circuitos de refrigeração e condensação determina o lift do equipamento, que afeta diretamente a capacidade total e também no consumo elétrico do equipamento. Portanto, essa divisão da carga em duas etapas permite manter o lift total entre os circuitos, o mesmo que seria atingido com os chillers em paralelo, mas reduzindo o lift de cada chiller individualmente, o que faz com que o lift médio entre os chillers seja menor nestes arranjos, proporcionando economia de energia na operação sem prejudicar a capacidade térmica do sistema.
Alguns projetos aproveitam as temperaturas diferentes de água gelada para também alimentar fancoils que atendam áreas com demandas específicas. É muito comum, principalmente em laboratórios e áreas produtivas, que diferentes ambientes apresentem condições diferentes de temperatura, sendo normalmente atendidas por equipamentos dimensionados para uma mesma condição de água gelada. Trabalhar com circuitos em temperaturas diferentes aumenta a versatilidade da instalação, permitindo que cada equipamento opere em condições específicas com maior eficiência, e também permite um controle mais preciso das vazões e temperaturas de água gelada, otimizando assim toda a operação do sistema.
Sistemas ar-água: soluções seguras para uma variedade de aplicações possíveis
Os sistemas ar-água certamente são o que há de mais eficiente quando se olha para o lado do ar, já que resolvem simultaneamente os problemas de carga térmica e ventilação interna dos ambientes com reduzida aplicação de materiais na instalação e baixo consumo elétrico, além de sua altíssima versatilidade de aplicação e baixo requisito de espaço para instalação.
A maior parte dos edifícios atualmente apresenta uma grande quantidade de equipamentos, fachadas envidraçadas e outras fontes internas de calor sensível. Tratar esta carga térmica juntamente com a carga térmica do ar externo demanda uma maior vazão de ar e, consequentemente, alto custo de instalação para distribuição do ar e maior consumo de energia elétrica pelos equipamentos. Os sistemas ar-água permitem que toda a carga térmica sensível dos ambientes seja tratada independentemente do tratamento do ar externo, dispensando rede de dutos para distribuição do ar e também permitindo uma redução nos equipamentos dedicados para tratamento do ar externo, o que reduz consideravelmente o custo de implementação do sistema. Além disso, o fato de o sistema ar-água conduzir a energia térmica apenas através da água gelada, que possui uma capacidade de condução de calor muito maior do que o ar, proporciona uma redução significativa no consumo elétrico total em decorrência da redução de até 70% na vazão de ar do sistema.
Os sistemas ar-água podem ser compostos por unidades passivas ou ativas. As unidades passivas utilizam os princípios de convecção e radiação para realizar a troca térmica entre o ar do ambiente e as serpentinas de água gelada das unidades. O calor radiado das fontes internas, como pessoas, iluminação, computadores, fachadas envidraçadas, é conduzido para a parte superior do ambiente pelo ar, que se torna mais leve por estar aquecido e sobe em direção às vigas frias. Em contato com os trocadores de calor, o ar dissipa o calor e então é resfriado, retornando para o ambiente.
Sistemas ar-água do tipo viga fria passiva. No sistema ativo, o ar aquecido passa pela viga fria e dissipa calor, retornando resfriado para o ambiente. No detalhe, instalação de vigas frias passivas na sede do Banco Real da Escócia.
As unidades ativas utilizam o princípio de indução para realizar a troca térmica entre o ar do ambiente e as serpentinas de água gelada das unidades, utilizando o fluxo de ar externo, chamado de ar de ativação, para induzir a passagem do ar de retorno, chamado de ar secundário, pelas vigas. Da mesma forma que ocorre no sistema passivo, aqui também o ar que retorna do ambiente carrega o calor radiado das fontes internas para cima, mas sua passagem pelos trocadores de calor é induzida pelo fluxo de ar externo que é insuflado no interior da viga. O ar que é distribuído no ambiente é resultado da mistura do ar externo com o ar resfriado pela viga fria.
Sistemas ar-água do tipo viga fria ativa. No sistema ativo, o ar externo é alimentado diretamente na viga e se mistura com o ar secundário que retorna do ambiente. No detalhe, instalação de vigas frias ativas na Caixa de Assistência dos Funcionários do BANERJ, no Rio de Janeiro.
Os sistemas ar-água demandam uma atenção especial para a temperatura de ponto de orvalho, uma vez que os trocadores de calor das vigas frias trabalham praticamente secos e qualquer variação na umidade do ambiente pode provocar condensação. Por segurança, deve-se manter a temperatura de alimentação da água gelada sempre 1 °C acima da temperatura de ponto de orvalho, o que demanda um sistema de controle preciso, tanto para as condições do ambiente como para operação dos chillers. A consequência positiva dessa operação rigorosamente controlada é que, para uma condição ambiente de 26 °C e 50% de umidade, estaremos falando em um dew point de aproximadamente 15 °C, o que significa fornecer água gelada a 16 °C - trabalhar com essa temperatura de água gelada mais elevada proporciona ganhos de até 40% na eficiência energética dos chillers.
Dada a sua versatilidade e pouca necessidade de espaço para instalação, aliadas aos sistemas de automação mais sofisticados que estão disponíveis atualmente no mercado e ao fortíssimo apelo por eficiência energética, pode-se dizer tranquilamente que os sistemas ar-água são soluções seguras para uma variedade de aplicações possíveis em diferentes edifícios, sejam eles escritórios, hospitais, escolas e universidades, e até mesmo shopping centers.
Sistemas de expansão direta: evolução tecnológica constante
A análise dos sistemas de expansão direta segue a mesma lógica dos sistemas de água gelada, podendo ser feita de forma separada para as unidades condensadoras e evaporadoras.
Do lado externo, as condensadoras vêm passando por uma evolução tecnológica similar à dos chillers, com uma constante atualização dos principais componentes. Compressores do tipo scroll de alta performance, ventiladores com hélices de perfil aerodinâmico aprimorado e controladores embarcados garantem um ganho em eficiência energética mesmo em regime de rotação constante. A tecnologia inverter aplicada a estes componentes eleva ainda mais a eficiência energética das condensadoras e pode proporcionar uma redução de consumo da ordem de 30%.
Do lado interno, podemos tratar as unidades evaporadoras como fancoils de expansão direta, de modo que valem as mesmas recomendações de tecnologias disponíveis: ventiladores de acoplamento direto e motores eletrônicos, emissores UVC para proteção das serpentinas, utilização de filtros de alta performance e baixa perda de carga, e principalmente, sistema de automação e monitoramento com conexão à rede via plataforma IoT. Atenção especial deve ser dada ao fluído refrigerante utilizado, uma vez que há diversas alternativas ao R-22 que apresentam maior eficiência energética e menor volume de fluído por unidade de capacidade térmica.
Referências Bibliográficas:
McKinsey Global Institute. Unlocking the potential of the Internet of Things, 2015.
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Internet das Coisas: um plano de ação para o Brasil, 2017.
Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI). Indústria 4.0 pode economizar R$ 73 bilhões ao ano para o Brasil, 2017.
MITSID. Guia interativo de eficiência energética em edificações., 2018.
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