Por Paula Caires
Conteúdo publicado em 30 de janeiro de 2019
Camará Shopping, inaugurado em maio, em Camaragibe/PE, que utiliza o lixo de Praça de Alimentação como fonte energética
Apesar dos pesares, como as instabilidades político-econômicas, o setor de shopping centers no Brasil mantém uma escala ascendente de crescimento em número de shoppings e Área Bruta Locável (ABL), desde 2006. Com 571 empreendimentos no final do ano passado, o setor deve fechar 2018 com mais 26 shoppings no País e já há outros 19 malls com inaugurações previstas para 2019, segundo a Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce).
Mais que mostrar que o modelo de negócio ainda está longe da saturação, tal crescimento demonstra que o setor não está inerte diante das transformações exponenciais alavancadas pela tecnologia, que impactam diretamente no comportamento dos diversos públicos estratégicos que envolvem o negócio – consumidores, colaboradores, lojistas, acionistas e empreendedores –, todos cada vez mais exigentes.
Se, como diz o famoso provérbio, “a necessidade é a mãe da invenção”, os novos projetos trazem inovações, que aumentam seu comprometimento com o meio onde estão inseridos, em termos ambientais e/ou sociais, mas que também se traduzem em eficiência – o famoso fazer mais, com menos e melhor.
“Ainda há espaço para shoppings, mas vivemos um momento diferenciado. Assim como todos os setores da indústria, o nosso também foi bastante afetado, o que pressionou a locação de lojas, os valores de aluguéis e, consequentemente, a remuneração dos empreendimentos”, afirma o Gerente de Operações do Itaquá Garden Shopping, Márcio Reis. Por isso, “o projeto foi todo pensado para que no final, dados os cenários econômico e de desenvolvimento do setor, tivéssemos oportunidade de uma operação mais eficiente e com custos menores”, acrescenta. O resultado fala por si só: em menos de um ano em operação, o empreendimento já está com 83% da ABL locada.
Com um formato totalmente inovador no País, que possibilita um custo de ocupação até 50% menor que o de formatos clássicos, o Porto Belo Outlet Premium também comemora sua taxa de ocupação em um ano: 98%. E o empreendimento já está com uma expansão anunciada para o segundo semestre de 2019, além de um novo outlet, no mesmo formato, na cidade de Campo Largo, Região Metropolitana de Curitiba, para 2020.
“O Brasil vive períodos de ciclos e crises, e a crise gera oportunidades. Visitamos muitos varejistas de 2012 para frente e detectamos que alguns estavam reduzindo suas operações, outros expandindo, mas a indústria estava com um estoque muito grande. Fizemos um trabalho de benchmarking e enxergamos a oportunidade de trazer um conceito 100% estadunidense, em que o lojista é a própria indústria ou um distribuidor da marca. O fato de que a indústria está vindo para o varejo é um caminho sem volta, já consolidado nos Estados Unidos, e estamos despertando no fabricante, no Brasil, essa cultura de fabricar diretamente para outlet”, pontua o superintendente do Grupo Tacla, Michael Domingues, responsável pelo empreendimento.
Localizado entre Florianópolis e Balneário Camboriú, o grupo considera o empreendimento como o primeiro do segmento no Brasil com conceito 100% norte-americano – a céu aberto, em formato village. São 25 mil m² de ABL, em um terreno de 300 mil m² às margens da BR-101, com projeto de paisagismo de um estúdio de Dallas, adaptado a plantas nativas e da região, e projeto de iluminação do Lighting Designer Theo Kondos, autor de grandes projetos em diversos países da Europa. Sem elevadores, escadas rolantes, nem ar condicionado nos corredores, o custo menor é garantido e o desconto também, inclusive, contratualmente. “Há uma cláusula de desconto mínimo obrigatório de 35% em relação às lojas de rua ou de shoppings”, destaca Domingues.
Inovação e busca por oportunidades também caracterizam a atuação da BR Malls. Para incrementar vendas aos lojistas, além de aproximar shoppings e varejistas na busca de novas soluções para desafios decorrentes de e-commerce e do consumidor multicanal, uma das alternativas foi a parceria com a Delivery Center, uma plataforma, especializada em logística fracionada, que está usando os shoppings como centrais de distribuição, buscando integrar o varejo físico ao on-line, com entrega de produtos no mesmo dia ou até na mesma hora da compra.
Em agosto deste ano a companhia também anunciou uma parceria inédita com o espaço de fomento ao empreendedorismo tecnológico da América Latina, o Cubo Itaú, onde será responsável por um andar inteiro dedicado ao varejo. E, em 2017, já havia lançado o brMalls Partners, iniciativa inédita no setor de varejo no Brasil em parceria com a Endeavor, que selecionou 15 varejistas com potencial de crescimento para serem acelerados.
Inovação pra conter um vilão
Para ajudar na rentabilidade, equilibrando a conta dos custos condominiais, um dos pontos de ataque, que têm se mostrado comuns nos novos empreendimentos, são os custos energéticos. O Itaquá já nasceu no mercado livre de energia, tendo, também, recebido o Certificado Comerc-Sinerconsult de Energia Renovável, pelo consumo voluntário de energia de fontes renováveis. Segundo Reis, 27% do montante de energia consumidos pelo empreendimento são provenientes de pequenas centrais hidrelétricas e de energia eólica.
Para gerir o grande vilão das contas, responsável por até 50% dos custos de energia, o Itaquá usa equipamento de ar condicionado com chillers, que fazem a troca de calor por termoacumulação durante a noite, para ser usado o ar refrigerado durante o dia.
No Camará Shopping, inaugurado em maio, em Camaragibe, no Pernambuco, essa pequena mudança já economizou 20% nos custos de energia. “No mercado cativo, a energia é 30% mais cara na ponta. É quando desligamos o equipamento e deixamos a circulação só por conta da água gelada, que foi gerada na madrugada”, conta o Coordenador Regional de Operações da AD Shopping, que faz a gestão do empreendimento, Aurélio Filizzola.
O empreendimento também conta com um biodigestor para a geração de energia alternativa – um projeto piloto criado para atender a necessidade de destinação do lixo que era gerado na obra. Hoje, explica Filizzola, “o biodigestor é alimentado por 100% do lixo orgânico gerado na praça de alimentação. Ainda é uma pequena quantidade de energia gerada, mas trata-se de uma potência instalada”. O equipamento tem capacidade para aproveitar até cinco toneladas de lixo orgânico. No momento, opera com uma tonelada, gerando cerca de 30 KVA/mês.
Vencedor do Prêmio Abrasce 2018 na categoria “Novos Empreendimentos”, o ParkShopping Canoas, em Canoas/RS, foi totalmente desenvolvido e construído pela Multiplan com foco na sustentabilidade e no baixo custo condominial, com destaque para a maior planta fotovoltaica já construída sobre um empreendimento na América do Sul. Em uma área de 18 mil m² estão instalados 4.160 painéis fotovoltaicos com capacidade de produção de 1.3 megawatts. O empreendimento possui ainda 13 árvores com placa solares no estacionamento, luminárias com lâmpadas LED de máxima eficiência energética, e utilização de vidros low-e (do inglês, low emissivity), de alta performance, com redução significativa do consumo de energia e do ar condicionado.
O sistema de ar condicionado também utiliza chillers, equipamento que resfria a água e aumenta a eficiência e o conforto térmico por meio de sensores nas áreas comuns que fazem o uso racional da climatização. Enquanto que o sistema de reúso de águas pluviais captadas nos telhados e nos drenos de ar condicionado para reutilização nas bacias sanitárias tem reservatórios de polipropileno, proporcionando maior facilidade de limpeza, manutenção e durabilidade; e a água da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) é reaproveitada nas torres de resfriamento, lavagem de pátios, irrigação e bacias sanitárias. Todas essas características já qualificaram o empreendimento para receber a pré-certificação do selo Leadership in Energy anda Environmental Design (Leed). São 264 lojas em uma área construída de 136 mil m² e 48 mil m² de ABL.
No Passo Fundo Shopping, inaugurado em novembro, em Passo Fundo/RS, as grandes claraboias nos corredores favorecem a circulação de ar, permitindo que os equipamentos de ar condicionado sejam usados em apenas 60% a 70% da sua capacidade, mantendo a sensação térmica recomendada, de 23 °C, mesmo nos dias mais quentes. Todo o sistema também é gerido por meio de softwares de controle, que viabilizam a identificação rápida e assertiva de problemas.
Inovação, desde o nascimento
Além das soluções inovadoras aplicadas, esses empreendimentos têm a possibilidade de explorar novos recursos desde a sua concepção. É o caso do Itaquá, que trouxe inovação para o projeto arquitetônico, reduzindo o tempo de obra em algo em torno de em seis a oito meses. Trata-se do isopainel – uma espécie de painel sanduíche constituído de duas chapas de alumínio unidas com um isolante térmico. “Com essa solução, é possível construir 300 m² com a mão de obra de apenas seis profissionais. E ele ainda oferece mais conforto térmico, redução do custo de manutenção e aumento da vida útil por ter uma pintura eletrostática”, elenca Reis. “Esse é o empreendimento da Tenco Shopping Centers que mais traz o conceito de sustentabilidade, aliado à redução de custos por conta da captação e tratamento de 100% do esgoto, e destinação de resíduos sólidos e orgânicos produzidos pelo empreendimento para um centro de reciclagem e compostagem próprio. Tenho isenção de pagamento do fator K à Sabesp pelo trabalho com o esgoto; custos menores no Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos (PGRS) ao evitar gastos com transportes; geração de emprego e renda; e menor impacto ambiental. Já deixamos de emitir 447,11 toneladas de CO2”, acrescenta, com orgulho, o Gerente.
O projeto arquitetônico do Passo Fundo Shopping também trouxe inovação para o setor, importando da indústria um modelo construtivo baseado em estruturas metálicas. Para o arquiteto Manoel Dória, o empreendimento de 60,2 mil m² de área construída, sendo 30 mil m² de ABL, é o único do varejo no País totalmente desenvolvido com essa solução. “É uma alternativa moderna, leve e de muita flexibilidade. Conseguimos uma obra limpa e de montagem mais fácil e organizada”, explica. Além disso, o Gerente Geral do empreendimento, José Maila, destaca o fator econômico. “Quanto mais limpa uma obra, menor também é o seu custo, pois temos menos consumo de água e economizamos em deslocamento – 100% das terras removidas, que totalizam cerca de 150 mil m³ de terra, foram realocadas no próprio empreendimento. A estimativa é de algo como 50% de economia”, afirma.
Integração
Seguindo a tendência de complexos multiuso, integrados ao meio e que, por si só, resolvem questões de fluxo, o Camará Shopping integra o Projeto Reserva Camará, que prevê a construção de torres residenciais, torres empresariais, museu, centro de convenções, hotel, faculdade e call center, a partir do segundo semestre de 2019.
Já o ParkShoppingCanoas é interligado, por meio de uma passarela, ao Parque Getúlio Vargas, que recebeu investimentos da Multiplan e atualmente conta com lago artificial de 7 mil m², que recebe contribuição de água pluvial do telhado do shopping e funciona como amortecimento para a macro bacia da região. O parque tem anfiteatro para 400 pessoas e diversas áreas de entretenimento infantil, equipamentos de ginástica para adultos, pista de caminhada e também recebeu novo paisagismo com vegetação nativa.
O shopping conta com a maior arena de patinação indoor no gelo da América do Sul, sete salas de cinema e uma praça de alimentação de 2,4 mil m² com amplo pé-direito – 12 metros de altura – onde está instalado um painel cinematográfico de LED de 63 m² que exibe vídeos, shows e jogos esportivos. Tudo isso dentro de uma área de vão livre de 150 metros de extensão por 40 metros de largura. O ParkShopping Canoas possui, ainda, um Centro de Eventos, com gerador de energia dedicado, e um amplo Centro Ecumênico.
O projeto arquitetônico do Passo Fundo Shopping também segue a linha da integração. Com um acesso direto pela rua e outro direto pelos estacionamentos, praças e espaços de convivência, ele possui um complexo de lazer com mais de oito mil metros de paisagismo, uma lagoa com espaço para shows, áreas de lazer, pistas para esportes, pêndulo e tirolesa, que serão administrados pela Cia da Aventura, previsto para o início deste ano.
A área do entorno do Passo Fundo Shopping terá também prédios residenciais e comerciais, além de uma torre corporativa do Intercity Hotels e do Infinity Office, formando um grande complexo multiuso. O hotel, com previsão de início das obras para o começo do ano, terá 16 andares, com 162 apartamentos com 21 m² cada, infraestrutura completa com auditório, salas de reuniões, academia, piscina, salão de café e jantar. O Infinity Office terá seis andares, com infraestrutura executiva completa com auditório, salas de reuniões e 48 salas comerciais, todas com vagas de estacionamento.
Em Santa Catarina, o modelo village do Porto Belo Outlet Premium se apropria da brisa do mar, com a praia localizada a apenas 600 metros, para arejar o ambiente aberto. Três grandes corredores com cobertura de vidro 1,8 metro mais alta que o pé-direito protege o público da chuva, sem abrir mão da luz natural, além das fachadas de loja com marquise e toldos que conferem charme ao conceito. E como mais um atrativo: o Museu da História do Futebol, inaugurado em parceria com o Instituto Soto Delatorre e com a Universidade do Vale do Itajaí (Univali), que traz três mil peças tombadas e registradas, algumas delas nunca antes expostas ao público.
Gestão
O modelo tradicional de gestão em shopping centers prevê um superintendente tendo como subordinados os gerentes de cada área, responsáveis por suas equipes orgânicas e os contratos de terceiros. No grupo Tenco, que administra o Itaquá, desde 2016 o gerente de operação responde a um diretor de operação, estando ao lado do superintendente na hierarquia, na verdade, um gestor de marketing e varejo, que responde a um diretor comercial. Na nova estrutura, todos os terceirizados são geridos pelo gerente de operação, assim como as equipes de manutenção e suporte a obras de lojistas. “Nossos contratos são totalmente focados em resultado. As empresas apresentam suas soluções e a forma como vão atingi-lo. Se vão fazer com dez ou com cem, o que importa é o valor e a meta acordados. Em todos os grandes contratos, como o de limpeza, segurança e processamento de resíduos, trabalhamos com indicadores de performance por meio de SLA”, destaca o Gerente de Operações.
Assim como a grande maioria, área consideradas estratégicas, como manutenção predial e operação de sistemas de CFTV, contam com equipes orgânicas, “porque a companhia tem uma preocupação muito grande com o ativo e entende que funcionários orgânicos para essas posições trazem mais agilidade e segurança”, justifica.
No Camará, o efetivo de liderança e manutenção predial também são orgânicos. Para os contratos de terceiros, o escopo enviado é previamente definido, mas com certa abertura a sugestões, casos que são avaliados por um comitê polivalente. É o exemplo do tratamento de pragas que deixou de ser apenas combativo para ser também preventivo, a partir de uma proposta recebida.
O modelo também é o adotado pelo Passo Fundo Shopping: efetivo de liderança e manutenção predial orgânicos, manutenção preventiva com especialistas e fabricantes dos equipamentos, e terceirizados para as áreas de conservação, limpeza, segurança e estacionamento.
Com manutenção reduzida pela sua própria natureza, a gestão do Porto Belo é feita por uma equipe orgânica, tanto na manutenção quanto na limpeza, estacionamento e segurança, sendo essa última um diferencial por posicionamento estratégico do grupo. “A equipe orgânica entende o negócio e a entrega que precisa ser feita para o consumidor”, defende Domingues.
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