Ana Paula Cassago
 

Um capítulo de "Black Mirror" no workplace?

As salas de reunião são o elemento mais representativo do ambiente de trabalho coletivo. Precisamos falar dela!

Notícia publicada em 29 de janeiro de 2019

O título desse artigo pode parecer provocativo, mas em uma grande parte das empresas, o uso de salas de reunião e sua gestão lembram um pouco essa série. Afinal, o cenário parece ser de tentativas de boas práticas, investimentos em tecnologia e uma estrutura arquitetônica sensacional, mas o uso em si esconde casos péssimos de cultura corporativa negativa e desperdícios.

Parece sem sentido que em 2019 as salas de reunião em escritórios corporativos ainda sejam um problema. E é um problema tão comum e generalizado, que parece também ter sido aceito por muita gente como "é assim mesmo", e que está em todo lugar. Afinal, é difícil encontrar uma empresa onde as pessoas acreditam realmente no que há no sistema de agendas, uma vez que usualmente nele está tudo cheio sempre, mas sempre tem "aquela sala vazia", para não dizer também "aquela sala invadida". Isso, quando não se trata do caso de que alguém é o centralizador da agenda, onde você pode estar desenvolvendo prioridades de agenda baseadas no grau de bom relacionamento que se tem com essa pessoa.

O fato de se aceitar o problema de salas como algo que não irá se resolver por completo, ou assumir a ignorância sobre o problema, é uma péssima estratégia para o gestor responsável pelo workplace. Essa frase pode ser forte, mas é verdadeira, pois o próprio gestor estará fortalecendo um dos principais itens do mal funcionamento do workplace, sendo responsável ainda pela criação e perpetuação de uma cultura negativa na corporação. E isso é o principal item que torna a performance do próprio gestor baixa, e a sua capacidade de atuação em inteligência sobre a dinâmica do espaço inexistente.

A causa-raiz disso é que, na sua essência, o workplace é um espaço de uso compartilhado. Se por um lado a eficiência do seu uso irá criar reflexos diretos na competitividade produtiva e financeira da empresa, por outro é dele que sai a percepção mais clara sobre qual a cultura corporativa existente na empresa. A questão é que as salas de reunião são o elemento mais representativo ou emblemático desse workplace coletivo. É a parte da empresa em que esse compartilhamento competitivo ocorre de forma mais intensa. Por consequência, erros de gestão sobre esse espaço irão consagrar efeitos na cultura corporativa.

Esses efeitos estão relacionados a um quebra-cabeça muito mais complexo relacionado à produtividade, clima organizacional, retorno de investimentos no workplace e ao recado aos colaboradores sobre qual a experiência de workplace que ele, gestor, deseja que o colaborador tenha. E é no alinhamento destas ações com a experiência do colaborador que reside a definição sobre o nível de engajamento ou não do colaborador ao trabalho do gestor de workplace.

Pelo papel que exercem na cultura do workplace, as salas de reunião são tratadas de uma forma muito aquém do que deveriam. E isso não é exagero! Veja: a cultura corporativa, ao contrário do que muita gente pensa, não é top-down, mas bottom-up. Quando se trata de cultura, é óbvio que as diretrizes dos gestores C-level indicam o caminho, mas a grande massa de toda a corporação é quem faz acontecer. No workplace, são as pessoas de forma generalizada que definem como tudo funciona, afinal a empresa é feita por pessoas e o espaço tem de estar preparado para que elas possam realizar suas atividades no dia a dia. A falta de alinhamento com essa "employee experience" gera naturalmente desvios. Por isso, as ações do gestor devem ser orientadas de maneira a garantir que a "employee experience" ocorra através de jornadas que façam sentido a este colaborador; é o ponto de partida sobre como resolver a questão. Por isso é fundamental entender os "value streams" relacionados ao caso.

Se você é daqueles que pensa que colocar várias funções em um tablet na porta é uma experiência boa, talvez também acredite que um controle remoto de TV com 90 funções é o que as pessoas querem para ter uma boa experiência com uma TV.

Você acha que não é assim que deve encarar o problema? Talvez seja melhor você marcar algumas conversas com a sua área de marketing, por exemplo. Pergunte a eles como e por que mudaram sua forma de se orientar nas relações com clientes nesses últimos anos. Verá que termos como "customer experience", jornadas etc. estão associados ao processo de transformação digital ambicionado pelo CEO (provavelmente o seu também), em virtude de algo que ocorreu de fora para dentro da empresa. A cultura digital crescente fora do ambiente de trabalho gera uma tensão cada vez maior ao desalinhamento das pessoas ao workplace.

Um outro problema é deixar isso como uma análise tecnológica. Não é! No entanto, somente com novas tecnologias é que o problema consegue ter uma saída. Talvez por isso, em muitas empresas a área de TI Corporativa, que diga-se de passagem não entende desse entrave, vai resolver sozinha a questão. E aí, muitas vezes o gestor de workplace não conseguiu perceber que tem de entender melhor de tecnologia para poder garantir o direcionamento correto do assunto internamente. Essa "ignorância" faz com que os gestores deixem o problema ser resolvido pelo projeto de arquitetura, e isto é uma ilusão porque este projeto se restringe a um dimensionamento do conjunto de salas (baseados em dados falsos, incompletos ou inexistentes), e não à gestão de dinâmica de uso e comportamentos.


... as salas de reunião são o elemento mais

representativo ou emblemático desse

workplace coletivo.

É a parte da empresa em que esse

compartilhamento competitivo ocorre

de forma mais intensa


Um outro paradigma que precisa também ser reorientado é como os gestores atuam sobre mudanças no workplace. Hoje a vivência é baseada em falta de informação, afinal o nível de informação que os gestores têm sobre o uso do workplace pelos milhares de colaboradores é muito baixo. Isso faz com que os problemas internos cresçam a tal ponto que fica impossível não viver em uma dependência de ciclos longos de negociação de budget para reformas de maior porte, ou seja - de alguns milhões; contratar um escritório que irá fazer um novo ambiente super cool, mas que não resolve a causa-raiz do problema. E a razão disso não dar certo é que esse paradigma de deixar o ambiente virar um caos, se garantindo em reformas ou soluções parciais para aí aliviar a situação até que ele fique um caos de novo, faliu.

O novo paradigma, que decorre do estabelecimento de uma cultura digital que é criada fora da empresa, faz com que as pessoas precisem que o workplace seja continuamente alterado para se adaptar às condições de negócio que a empresa for navegando ao longo do tempo. Imagine qual é o impacto na dinâmica de uso do workplace quando uma empresa fecha um novo ciclo de contratações e coloca mais 100 pessoas dentro, ou quando ela fecha aquele projeto significativo com um cliente, ou quando a área de negócios define que irá criar um novo produto. Ou o gestor cria condições de navegar nessa dinâmica, ou ele não vai conseguir exercer o seu papel corretamente. Atuar sobre o "cuidar" de forma eficiente, cria novas condições de gestão e uma percepção de que há uma eficiência muito maior ocorrendo, i.e., maior retorno de investimento.

Todo esse processo da influência de cultura digital externa vem como consequência de novas tecnologias no mercado. No caso do workplace, especificamente a Internet das Coisas (IoT), juntamente com analytics e mobile, atuando em conjunto, mudam o posicionamento do gestor na empresa. E, ao contrário do que se ouve, esse alinhamento do gestor com o colaborador não vem somente porque o gestor vai ter dados que não tinha antes.


Os gadgets (termo aplicado às "Coisas") são mais

do que sensores, pois eles podem agir onde estão

instalados, tornando o espaço mais apropriado

para uso, além de estimular o processo de educação

do colaborador, fazendo com que ele se engaje.


É muito simplório, para não dizer inadequado ao momento, falar que dados obtidos através de sensoriamento é suficiente. Não é. Os gadgets (termo aplicado às "Coisas") são mais do que sensores, pois eles podem agir onde estão instalados, tornando o espaço mais apropriado para uso, além de estimular o processo de educação do colaborador, fazendo com que ele se engaje, criando também uma cultura positiva.

Veja o caso de salas de reunião. Quais são as causas de fazer com que isso seja um problema? Acredite que são apenas 3, a saber: (1) as pessoas que têm reuniões canceladas e não cancelam as agendas, (2) reuniões que acabam mais cedo e as pessoas não atualizam as agendas, (3) a pessoa começa a utilizar entrando no horário do outro, ou a reunião que se prolongou e acabou entrando no horário da reunião seguinte. Os problemas (1) e (2) somente existem porque o sistema de agenda depende desse colaborador para ser atualizado, e ele não vai fazer isso até por conta do foco apenas no trabalho dele. Não adianta colocar as pessoas para fazer coisas que elas entendem que não deveriam, ou melhor, que elas entendem ser perda de produtividade para elas. O problema (3) somente existe porque as pessoas sabem que conseguem fazer isso sem terem nenhum problema ou mesmo sem serem expostos.

O efeito colateral disso são comportamentos generalizados, como: (1) a falta de compromisso com agendas visto que boa parte das reservas acaba sendo feita por prevenção, uma vez que todos acreditam que está tudo cheio sempre, (2) o esquecimento em liberar reservas quando reuniões são canceladas ou terminam mais cedo é um dos habilitadores de invasões de salas, (3) o consequente hábito de realizar os acordos informais de troca de reservas entre colegas, secretárias ou lideranças de áreas (mercado negro de reservas) , (4) a cobertura que alguns gestores, inclusive de nível alto, dá a times que estão usando de forma errada o workplace mas estão gerando seus resultados, (5) a percepção clara das pessoas que ninguém sabe que ela está "agindo errado" mantém o uso incorreto. Por isso que somente tablets em portas apenas não resolvem o problema: o escritório tem de ser smart.

Um exemplo de alternativa para adotar esse novo paradigma no caso de salas de reunião é o FreeRoom. O desenho conceitual desta solução atua na utilização de IoT para tomar decisões na ponta independente do usuário, criando confiança ao colaborador de que o escritório está realmente funcionando corretamente. Mais do que isso, viabiliza o entendimento real das jornadas e viabiliza o alinhamento com a experiência do colaborador. Em resumo, concretiza o engajamento do colaborador a uma cultura positiva de uso do workplace e coloca o gestor atuando em estratégia, e não apenas apagando incêndio.

Flávio Pimentel ([email protected]), Head of Smart Workplace Experience, e Marcelo Junqueira ([email protected]), Product & Operations Manager, da CI&T

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