Por Filipe Monteiro e Lílian Fonseca*
A sigla ESG (do inglês, Environmental, Social and Governance) vem sendo cada vez mais explorada pelas empresas na busca por pilares que garantam práticas alinhadas às expectativas dos stakeholders e que permitam a sustentabilidade da empresa ao longo do tempo, ou seja, a continuidade e geração de valor perene.
Embora uma análise primária do conceito ESG remeta de forma mais intuitiva a medidas de cuidado ao meio ambiente, assim como ações sociais que beneficiem comunidades mais vulneráveis e reestruturações internas que favoreçam uma cultura corporativa bem pautada em compliance, existem outras providências de natureza menos óbvia e mais complexa, porém tão ou até mais efetivas.
Uma possível frente para implementações menos triviais de valores ESG consiste nas investigações corporativas. Apesar de imersas em um contexto tipicamente reativo por serem realizadas após a ocorrência ou suspeita de quebras no código de conduta de uma organização, o trabalho conduzido pela consultoria traz muito mais do que o esclarecimento dos fatos e envolvidos, pois permite identificar fragilidades a serem combatidas para a prevenção de eventos futuros que possam ser prejudiciais à perenidade da corporação sob variados aspectos. Sendo assim, a pergunta que surge é: como as investigações corporativas podem favorecer os pilares ESG nas empresas?
Considerando inicialmente o viés ambiental, um assunto muito pertinente é o descarte adequado de resíduos, em especial para as indústrias. Infelizmente, não é incomum a ocorrência de incidentes causados pela negligência de processos ou não priorização do orçamento para a destinação correta do lixo gerado pela atividade do empreendimento. Investigações de eventos dessa natureza podem auxiliar na identificação de melhorias estruturais que garantam a execução correta das etapas ou, ainda, na constatação de desvios de verba da companhia que poderiam ser destinados para tal fim.
Outro aspecto ambiental relevante para qualquer empresa é o desperdício de recursos naturais. Apurações investigativas de desvios de matéria-prima, insumos ou suprimentos podem contribuir fortemente para o combate desse problema. Por fim, também é válido citar investigações que podem ser realizadas de maneira preventiva em aquisições, fusões ou até mesmo compra de terrenos, buscando apurar atividades anteriores, como a ocorrência de passivos, a existência de algum processo relacionado a questões ambientais em aberto ou, ainda, alguma evidência de prática de greenwashing, o que poderia acabar impactando a imagem da empresa compradora.
Sob a perspectiva de governança, investigações corporativas voltadas para desvios de conduta e quebras de procedimentos internos da empresa permitem identificar vulnerabilidades na estrutura e na cultura da organização que possam viabilizar a execução de um modus operandi fraudulento. Moedas de troca como bônus e metas, por exemplo, podem ser uma porta de entrada para manipulação e ocultação de resultados, causando impactos de difícil controle e mensuração. O ideal é que, uma vez identificadas as fragilidades, seja implementado não somente um plano de ação, mas um monitoramento para garantir que ele seja mantido de maneira contínua e consistente, pois a organização precisa de tempo para que as práticas ESG sejam assimiladas à cultura dos colaboradores de forma genuína.
Outro aspecto relevante neste sentido é averiguar com cautela os procedimentos adotados na escolha de fornecedores, parceiros e prestadores de serviço para eliminar possibilidades de favorecimentos e conflitos de interesse. Tal análise, inclusive, não precisa começar necessariamente em um contexto investigativo, mas pode também ser executada periodicamente por frentes preventivas de auditoria interna que, detectando qualquer anormalidade, podem acionar os especialistas em investigação para aprofundamento, descartando ou, eventualmente, revelando irregularidades até então desconhecidas pela empresa.
O pilar social também é contemplado por investigações corporativas com frequência considerável. Afinal, toda empresa, antes de qualquer serviço, produto ou resultado, é formada por pessoas, cuja proteção e dignidade deve ser garantida de maneira integral enquanto atuantes profissionais. Neste contexto, apurar desvios ou fragilidades nos processos diretamente relacionados à segurança e às condições de salubridade no trabalho - física e mental - ou utilizar de técnicas forenses para identificar ocorrências de assédio ou condutas inadequadas de qualquer natureza entre os colegas da organização é essencial para garantir que o ambiente empresarial esteja coerente com as boas práticas de conduta e convivência com as quais ela deseja ser referência diante do mercado.
Muito além de questões socioambientais, a sustentabilidade de qualquer negócio pelos valores ESG deve garantir sua própria existência no mercado, visto que danos à sua reputação, mesmo não sendo mensuráveis como um rombo financeiro, podem comprometer de maneira irreversível a credibilidade diante dos clientes, fornecedores e acionistas.
Mesmo se relacionando diretamente à superfície visível das organizações, os pilares ESG devem ter boa fundação e raízes robustas com todos os mecanismos da empresa para que, naturalmente, a impressão seja condizente com os valores, atitudes e eventos que a envolvem. Investigações corporativas certamente podem - e devem - transformar a empresa em um terreno favorável para a boa instalação desses três pilares, além de serem uma forte aliada dos principais stakeholders quando querem se certificar sobre algum aspecto ESG das organizações.
(*) Filipe Monteiro é gerente e Lílian Fonseca é consultora de Investigação. Ambos atuam na ICTS Protiviti, empresa especializada em soluções para gestão de riscos, compliance, ESG, auditoria interna, investigação, proteção e privacidade de dados.
Foto: Divulgação.