A dimensão e o foco da qualidade do ambiente interno (QAI) não é novidade. Mas quando se trata de escolas, parece que apontar o desempenho de nossos professores é bem mais fácil do que indicar a qualidade do ambiente construído e a sua QAI.
A QAI em edifícios comerciais tem recebido a atenção da imprensa ultimamente, principalmente após a morte do ex-ministro das comunicações Sérgio Motta e a consequente publicação da Portaria 3.523 pelo Ministério da Saúde em 28 de agosto de 1998.
Diversas legislações e normas técnicas foram publicadas no Brasil desde então, bem como inspeções e fiscalização por agentes sanitários, trabalhistas e de conselhos de órgãos de classe em sistemas de ar condicionado.
O World Green Building Council divulgou um relatório importante em setembro do ano passado, "Health, Wellbeing and Productivity in Offices: The next chapter for green building" (Saúde, bem-estar e produtividade em escritórios: O próximo capítulo para a construção verde), que tem gerado maior interesse na indústria de imóveis e construção.
Porém, pode-se argumentar que são as escolas, juntamente com a assistência à saúde, que têm as maiores implicações quando se trata da diferença entre bom e mau desempenho de QAI. Os alunos gastam cerca de 4 a 5 horas diárias, cinco dias por semana, 40 semanas por ano, durante aproximadamente 13 anos em salas de aula. O desempenho desses espaços é muito importante para o
desenvolvimento dos alunos.
Ventilação e CO2
A Resolução 09 de 16 de janeiro de 2003 da ANVISA - Agencia Nacional de Vigilância Sanitária, bem como outros órgãos internacionais, recomenda o máximo de 1000 partes por milhão (ppm) de CO2 para ambientes internos.
A ventilação inadequada faz com que CO2 e contaminantes do ar interior se acumulem em espaços ocupados. Em um grande número de escolas, os níveis de dióxido de carbono (como um indicador da eficiência da ventilação) passam de 3.000 ppm. Isso ocorre geralmente em salas ocupadas, frequentemente no verão, estação em que as salas de aulas são fechadas com ar condicionado e obviamente ficam sem ventilação adequada.
Esses níveis indicados para escritórios comerciais são levados em consideração para ajudar na concentração, estratégia, desempenho e produtividade dos funcionários. De fato, o estudo de 2012 chamado "O CO2 é um poluente de interior? Efeitos diretos de concentrações baixas a moderadas de CO2 no desempenho humano da tomada de decisão", Satish et al descobriu que quando os níveis aumentaram de 600 ppm a 1.000 ppm e 2.500 ppm, houve estatisticamente reduções significativas no desempenho nos escritórios; em alguns casos o desempenho de tarefas chegou a ser classificado como "disfuncional" quando em níveis de 2.500 ppm.
Apesar disso, os alunos estão expostos a níveis de dióxido de carbono que ultrapassam 3.000 ppm e então dizemos a eles que precisam melhorar o foco, a atenção e as notas para que possam competir com outros alunos internacionais em termos de alfabetização e demais padrões.
Dados compilados pelo Wisconsin Department of Health Services, OSHA, NIOSH e ACGIH, órgãos norte-americanos, indicaram que um nível de 1.000 ppm "indica ventilação inapropriada; queixas como dor de cabeça, fadiga e irritação dos olhos e da garganta ficam mais generalizadas; o nível de 1.000 ppm deve
ser usado como limite máximo nos níveis internos" e níveis entre 2.000 e 5.000 ppm estão "...associados a dores de cabeça, sonolência e ar abafado, pesado, estagnado. Falta de concentração, perda de atenção, aumento da frequência cardíaca e enjoo leve também podem estar presentes".
Os autores do estudo "O CO2 é um poluente de interior? Efeitos diretos de concentrações baixas a moderadas de CO2 no desempenho humano da tomada de decisão" também argumentam que o efeito de 2.500 ppm de dióxido de carbono equivale aproximadamente a uma concentração de 0,08 de álcool no
sangue - acima do limite de 0,05 para condução de veículo.
Então, quais são os níveis característicos de CO2 nas salas de aula? Um estudo de 2002 com 120 salas de aula no Texas mostrou que 88% das salas de aulas tinham índices acima de 1.000 ppm e que, de forma alarmante, 21% das salas de aulas estavam com índices acima de 3.000 ppm.
Outro estudo da Universidade Técnica da Dinamarca, mostra ganhos de performance dos alunos em 14,5% em ambientes com uma boa qualidade do ar. Isso representa que um aluno é capaz de aprender em 06 anos o que ele aprenderia em 07. Nem precisa ser bom em matemática para enxergar o ganho financeiro para um país com investimentos nesse assunto.
A realidade mostra cada vez mais salas de aula com mais alunos e com menos espaço e janelas reduzidas, causam esse ambiente saturado.
Compostos Orgânicos Voláteis
Uma consequência adicional da ventilação inadequada é o acúmulo de outros contaminantes do ar interior, como os compostos orgânicos voláteis - COVs, incluindo o formaldeído. Os COVs podem ser encontrados em diversos produtos de construção e manutenção utilizados nas salas de aula, incluindo tapetes, vinil, tintas, selantes, plásticos, produtos de madeira, móveis, eletrônicos, agentes de limpeza e tantos outros.
A toxicidade dos COVs varia. Muitos são conhecidos pelos efeitos significativos para a saúde: sabe-se que alguns são irritantes e que outros causam câncer (carcinogênicos), mutações, além de outros efeitos indesejáveis. Em ambientes externos, os COVs podem se dispersar facilmente antes de causarem efeitos
para a saúde, mas em ambientes fechados, com pouca ventilação, como uma sala de aula, os COVs podem se acumular e criar perigo para a saúde.
Além de efeitos significativos para a saúde, uma equipe da Universidade da Califórnia, em Berkeley, liderada por Bill Fisk encontrou declínios cognitivos (raciocínio prejudicado) relacionados com a exposição a COVs em níveis típicos de um escritório que tinha sido renovado no ano anterior.
Muitas escolas na Austrália que tinham problemas antes e depois reduziram problemas associados com COVs, através de um enfoque mais forte na seleção do material e no gerenciamento da IAQ.
Contaminantes microbianos
Outro grande problema é a capacidade do ar interior de espalhar infecções virais e bacterianas, sendo a proliferação de mofo um fator de contribuição especial. Há uma crescente incidência de condições de saúde crônicas, como asma, viroses. alergias e outras sensibilidades. A asma é a principal causa de faltas
nas escolas entre as crianças dos Estados Unidos.
Um estudo feito em 2003, mostrou que os efeitos nas escolas contaminadas por mofo nos Estados Unidos incluem reações alérgicas imediatas significativas em alunos e professores. Além disso, mais de dois anos depois da exposição, muitos desses alunos e professores continuaram a ter reações que não estavam presentes antes da exposição.
Isto tem implicações significativas para as escolas com o aquecimento do clima e o aumento no índice de infiltrações, associadas a inundações e vazamentos de água. O risco de problemas com mofo nas salas de aula tende a aumentar e trará consequências para a saúde das crianças nas escolas. Este é um problema global.
Um novo relatório da Organização Mundial de Saúde mostrou que os ambientes internos de baixa qualidade nas escolas são um problema importante em muitos países na região europeia, com problemas que incluem ambiente mal ventilado e abafado, umidade e mofo, temperaturas incômodas e sanitários em mau funcionamento.
Embora o relatório afirme que os países de renda alta têm políticas para melhorar a qualidade do ar interior nas escolas, inclusive com padrões para ventilação, a baixa qualidade da ventilação e o ar abafado nas salas de aula, principalmente durante as estações mais frias, continuam a ser um problema comum a todos. Isto tem tido efeitos negativos na saúde respiratória, no absenteísmo, no desempenho acadêmico e no bem-estar dos alunos.
A exposição ao mofo e à umidade também é comum em alguns países, enquanto a melhoria no saneamento e na higiene das escolas permanece sendo um desafio nos países em desenvolvimento. A infraestrutura deficiente e a manutenção inadequada das instalações são razões por trás da baixa satisfação dos alunos com sanitários e instalações de higiene e o escasso uso que fazem deles.
Existem problemas ambientais importantes nas escolas, que são essencialmente negligenciados. As pessoas responsáveis pela tomada de decisão devem analisar as evidências e certificar-se que as normas e regulamentações existentes sejam implementadas.
Recentemente, a Prefeitura de Santos, no litoral paulista, licitou a compra de 3.000 aparelhos de ar condicionado do tipo Split para escolas do município. Apesar de ser uma ação com objetivo de trazer conforto aos alunos e professores, é uma catástrofe em relação a qualidade do ar interna.
Esse aparelho de ar condicionado, Split, é para uso apenas em ambientes residências. Para ser utilizado em ambientes não residenciais, deve ser feito adaptações como sistema de filtragem eficiente e renovação de ar, que permitam ao ambiente não ter um ar saturado.
O aparelho Split convencional não possui filtragem adequada e nem renovação de ar. Infelizmente me nosso pais esse tipo de equipamento vem sendo utilizado em aplicações não residências em larga escala e representa mais de 90% das vendas de aparelho de ar condicionado no Brasil. Isso resulta em diversos ambientes com instalações irregulares, fora das normas técnicas e legislações brasileiras.
Um Programa de Qualidade do Ar em Escolas deve estar na agenda de desenvolvimento do país, principalmente quando o governo deseja ser uma PÁTRIA EDUCADORA.
Leonardo Cozac é Engenheiro Civil e de Segurança do Trabalho, especialista certificado em Qualidade do Ar Interno e Diretor da Conforlab
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Foto destaque: meramente ilustrativa | perspectiva eletrônica ambientes UniAmérica