Sorteios 11ª Expo
 

Covid-19 é ou não doença ocupacional do trabalho?

Especialistas jurídicos esclarecem sobre o tema

No dia 1 de setembro foi publicada pelo Ministério da Saúde a Portaria n.º 2.309, de 28 de agosto de 2020, que atualizou a Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho (LDRT), destinada a orientar os profissionais do Sistema Único de Saúde (SUS) acerca da caracterização das relações entre as doenças e as ocupações profissionais.

A Covid-19, causada pelo coronavírus, tinha sido listada inicialmente como doença ocupacional, relacionada ao trabalho. Entretanto, a referida norma foi tornada sem efeito no dia seguinte, por meio da Portaria n.º 2.345, de 2 de setembro de 2020.

E essa mudança de entendimento do Governo Federal decorreu da grande divergência de interpretação de que a contaminação pelo coronavírus pudesse ser entendida como acidente do trabalho reconhecido como tal pelo INSS, quando o afastamento ocorresse por período superior a 15 dias, com direito a todos os reflexos trabalhistas e previdenciários daí decorrentes.

Aliás, como exemplo dessa confusão interpretativa, alguns Fiscais do Trabalho já têm exigido que as empresas emitam a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT) para qualquer contaminação de empregados pela COVID-19.

Assim, a suspensão dos efeitos da portaria ministerial é oportuna, pois a discussão sobre o enquadramento da Covid-19 como doença ocupacional se arrasta desde a Medida Provisória n.º 927, de 22.3.2020, que determinou que os casos de contaminação pelo coronavírus não seriam considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal. Importante lembrar que no dia 29.4.2020, o Supremo Tribunal Federal decidiu pela suspensão da eficácia do referido dispositivo legal, trazendo interpretações de que a contaminação pelo vírus no ambiente laboral não pode ser presumida.

Registre-se que a doença ocupacional é um gênero do qual são espécies a doença profissional e a doença do trabalho, previstas que estão na legislação previdenciária (art. 20, I e II, da Lei n.º 8213/91), cujo enquadramento decorre da existência de nexo causal presumido ou não.

O nexo causal presumido apenas poderá ser reconhecido quando relacionado ao NTEP - Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário, nos termos do art. 337, §3º, do Decreto n.º 3048/99, conforme relação disposta taxativamente na Lista C. do Anexo II, do mesmo texto legal.

Também não deve ser esquecida a previsão inserta no art. 20, §1º, alínea "d", da Lei n.º 8213/91, que dispõe que não são consideradas como doença do trabalho as doenças endêmicas adquiridas pelos segurados. Como atualmente tratamos de uma pandemia, com extensão e gravidade muito superiores à endemia, o artigo referido também tem muita pertinência para a solução da atual controvérsia.

A contaminação e a consequente possível situação de incapacidade para o trabalho do empregado deverá ser analisada pelo INSS, da mesma forma que as demais situações que suportam o pagamento de benefício previdenciário.

Ressalte-se que a contaminação de qualquer pessoa poderá ocorrer em casa, no deslocamento residência x trabalho e vice-versa, nos estabelecimentos comerciais relacionados ou não às atividades essenciais ou de lazer, e também no ambiente trabalho.

Caberá ao empregador, em eventual discussão administrativa ou judicial futura, demonstrar os cuidados que adotou para preservar a saúde de seus trabalhadores, como identificação de riscos, histórico ocupacional, trabalho em home office, escalas de trabalho, rodízio de profissionais, orientação e fiscalização sobre adoção de medidas relacionadas à saúde e segurança, além da entrega de equipamentos de proteção individual (EPI 's).

A preocupação com essa definição vai muito além da emissão da CAT e da garantia de estabilidade de 12 meses no emprego após a alta médica previdenciária prevista no art. 118, da Lei n.º 8213/91. É muito importante que a sociedade saiba interpretar corretamente a decisão do STF, assim como os ditames da Portaria do Ministério da Saúde que foi tornada sem efeito por ora, a fim de entender a extensão e o potencial grau destrutivo dessa interpretação precipitada pela caracterização "automática" do nexo causal

Infelizmente inúmeros contaminados pelo coronavírus vêm a óbito, impactando de forma mais assertiva no cálculo do FAP (e nos encargos incidentes em folha de pagamento), acerto de verbas rescisórias e de benefícios legais e convencionais decorrentes, ressarcimento de despesas médicas e hospitalares, danos morais e até pensão mensal vitalícia.

Se o empregador tiver que assumir também a responsabilidade pelo contágio dos empregados neste momento de pandemia e calamidade públicas, é bastante provável que prefira dispensar os empregados. Não nos parece, porém, que essa seja a melhor decisão a ser tomada.

Assim, independentemente da vigência da portaria ministerial em questão, apenas se caracterizado o nexo causal entre a doença e o exercício do trabalho (ou as condições em que o mesmo é exercido), a empresa deverá emitir o CAT e garantir os direitos inerentes aos seus funcionários.

Por fim, é imprescindível que as empresas documentem todas as iniciativas preventivas e orientativas adotadas em relação à saúde de seus empregados, a fim de poder demonstrar, em eventual discussão futura, que cumpriram com todas as obrigações e cuidados cabíveis a fim de preservar a saúde de seus colaboradores.

Ricardo Calcini, professor de Direito do Trabalho da Pós-Graduação da FMU. Mestre em Direito pela PUC/SP. Membro do Comitê Técnico da Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária. ​Maria Cibele de Oliveira Ramos Valença, Advogada, Mestre e Doutora em Direito Previdenciário pela PUC/SP, professora em cursos de pós graduação, autora de livros e artigos em periódicos.

Envie os nossos conteúdos por e-mail. Utilize o formulário abaixo e compartilhe os link deste conteúdo com outros profissionais. Aproveite e escreve uma mensagem bacana.

Faça uma busca


Visitas Técnicas esgotando

Mais lidas da semana

Operações

Do auxiliar de limpeza ao presidente: segurança é responsabilidade de todos

Para especialista, prevenção de incêndios é urgente e negligência pode ser explicada através dos três pilares da manutenção.

Outside Work

Livro para expandir horizontes do conhecimento e da imaginação em FM

E os malefícios da dedicação às redes sociais para a saúde

UrbanFM

O que mudou na gestão do Parque Ibirapuera?

Camila Praim, coordenadora de operações, fala sobre experiência na gestão do parque durante processo de concessão e de desterceirização.

Workplace

Qual o futuro dos escritórios?

Pesquisa indica pontos que serão tendência ao longo de 2024.

Sugestões da Redação

Revista InfraFM

Da engenharia à gestão sustentável

Acompanhe nossa conversa com Irimar Palombo sobre inovação, desafios em sua carreira, que tem contribuído para a transformação dos espaços e construção do futuro no escopo do Facility Management.

Revista InfraFM

Gestão de Facilities em ambientes remotos e industriais

Uma visão abrangente sobre experiências, segurança e sustentabilidade nas operações de grandes empresas.

Revista InfraFM

O escritório como espaço acústico para atender ao modelo híbrido de trabalho.

Artigo da Arqta. Dra. Claudia Andrade e do Eng. Acústico Bruno Amabile.

Revista InfraFM

Gestão de Facilities e a ciência por trás dos data centers

A ciência por trás dos data centers, artigo de Henrique Bissochi e Edmar Cioletti, ambos da Tools Digital Services, uma empresa do Grupo Santander.

 
Dúvidas sobre os EVENTOS?
Fale com a nossa equipe pelo WhatsAPP